A Assembleia de Deus e o movimento neoassembleiano


Sou pentecostal, membro da Igreja Evangélica Assembleia de Deus desde 1987. Neste ano, fui batizado com o Espírito Santo e nas águas, nessa ordem. Creio em milagres, minha vida é um milagre, tenho visto muitos milagres. Nasci num lar pentecostal e cresci em meio a visões, revelações, curas, línguas estranhas, etc. E, por mais que eu tenha hoje um lado contestador — que não é exclusividade minha, posto que Paulo (2 Co 11.3-15) e o próprio Senhor Jesus (Mt 23; Ap 2-3), só para exemplificar, também se opuseram a heresias e modismos —, sempre cri na multíplice obra do Espírito Santo mediante a diversidade de dons, ministérios e operações (1 Co 12.4-11).

Mesmo assim, sou contra — por que a Palavra de Deus também o é — ao movimento neoassembleiano, que é experiencialista e prioriza manifestações como “cair no poder”, “unção do riso”, “unção do leão”, “unção da lagartixa”, além da ênfase exagerada à prosperidade financeira, que muitos chamam de uma “unção financeira dos últimos dias”.

Na adolescência e na juventude, tive contato com todo o tipo de manifestação pentecostal e pseudopentecostal. Sei o que são cultos no monte; conheço vigílias do “reteté”, que na minha época não recebiam esse adjetivo grotesco e vulgarizante. Fui dirigente de duas congregações em São Paulo e conheci todo o tipo de crente, dos mais frios aos mais fervorosos; desde os mais céticos até os mais fanáticos.

Por graça de Deus, sou ministro do Evangelho desde 1992, ano em que fui consagrado a presbítero (ministro local), mas recebi o título de ministro pela CGADB (Convenção Geral das Assembleias de Deus) somente em 1997, na Assembleia de Deus do Belenzinho em São Paulo. Na ocasião, tendo o meu nome apresentado pelo saudoso pastor e pregador do Evangelho Valdir Nunes Bícego, fui consagrado ao santo ministério numa reunião presidida pelo pastor José Wellington Bezerra da Costa.

Que fique clara uma coisa: não sou um teórico, frio, gelado. Tenho plena convicção bíblica e experiencial de que o “cair no Espírito” e outras manifestações que ora ocorrem no meio da quase-centenária Assembleia de Deus não têm aprovação divina. Não estou sendo apressado em minhas conclusões. Falo com conhecimento de causa, depois de ter analisado cuidadosamente as bases e os resultados das tais manifestações.

Como tenho dito em meus livros editados pela CPAD, pessoas sinceras e tementes a Deus estão certas de que o “cair no Espírito” e a “unção do riso” são bíblicos. E algumas se apegam ao fato de manifestações similares às mencionadas terem ocorrido na Rua Azusa, em Los Angeles, no começo do século XX, e no início da Assembleia de Deus no Brasil. Mas é claro que as experiências relacionadas com o reavivamento do Movimento Pentecostal não se comparam com as aberrações que vemos hoje.

Naquela época, não havia paletó e sopro “ungidos”, empurrões “sutis”, uivos, rugidos, latidos, pessoas rastejando pelo chão, grudadas na parede, etc. Além disso, não se deve supervalorizar as experiências vividas pelos pentecostais do começo do século XX, a ponto de as equipararmos às incontestáveis verdades da Bíblia. Devemos, sim, respeitar os pioneiros, mas a nossa fonte primacial, precípua, de autoridade tem de ser a Palavra de Deus.

O “cair no poder”, a “unção do riso” e manifestações afins não se coadunam com os princípios e mandamentos contidos em 1 Coríntios 14. Essas manifestações aberrantes não edificam (v.12); contrapõem-se ao uso da razão, necessário num culto genuinamente pentecostal (vv.15,20,32); levam os incrédulos a pensarem que os crentes estão loucos (v.23); e promovem desordem generalizada (vv.26-28,40).

Muitos neoassembleianos, defensores dessas manifestações, dizem que estão na liberdade do Espírito, porém o texto de 1 Coríntios 14 não avaliza toda e qualquer manifestação. No culto genuinamente pentecostal deve haver julgamento, discernimento, análise, exame (vv.29,33). Por isso, no versículo 37, está escrito: “Se alguém cuida ser profeta ou espiritual, reconheça que essas coisas que vos escrevo são mandamentos do Senhor”. Leia também 1 Tessalonicenses 5.21 (ARA); João 7.24 e 1 João 4.1.

Não tenho dúvidas de que o Senhor opera milagres extraordinários em nosso meio. Ele é o mesmo (Hb 13.8). Mas o que temos visto hoje em algumas Assembleias de Deus são práticas viciosas e repetitivas. Jesus curou um cego com lodo que fez com a sua própria saliva, porém Ele não metodizou esse modo de dar vista aos cegos. A obra de Deus surpreende, impressiona, positivamente, e deixa todos maravilhados (Lc 5.26). As falsificações são viciosas, premeditadas, propagandeadas, a fim de que o milagreiro receba a glória que é exclusivamente de Deus (Is 42.8).

O “cair no poder”, a “unção do riso” e outros “moveres” não têm apoio das Escrituras e não podem ser equiparados ao batismo com o Espírito Santo, com a evidência inicial de falar em outras línguas, mencionado com clareza na Palavra de Deus (Jl 2.28,29; Mc 16.15-20; At 2; 10; 19; 1 Co 12-14, etc.). Por isso, os neoassembleianos recorrem a passagens que nada têm que ver com o assunto.

Citam textos como 2 Crônicas 5.14 e 1 Reis 8.10,11 e dizem, com a boca cheia: “Os sacerdotes não resistiram a glória de Deus e caíram no poder”. Que engano! Veja o que a Bíblia realmente diz: “E sucedeu que saindo os sacerdotes do santuário, uma nuvem encheu a Casa do SENHOR. E não podiam ter-se em pé os sacerdotes para ministrar, por causa da nuvem, porque a glória do SENHOR enchera a Casa do SENHOR” (1 Rs 8.10,11). Observe que eles saíram do local; não ficaram ali caídos. Não houve também um “arrebatamento em grupo”.

A frase “não podiam ter-se em pé” tem sido empregada de modo errôneo e abusivo pelos neoassembleianos. Eles a interpretam como “caíram no poder”. Mas ela, na verdade, denota que os sacerdotes “não puderam permanecer ali”, o que fica ainda mais claro na versão Almeida Revista e Atualiza (ARA). Eles não suportaram permanecer no local ministrando! Não tinham como resistir a glória divina presente ali. Por isso, não permaneceram no local. Onde está escrito que eles caíram no poder?
Outro texto citado erroneamente em abono às manifestações neoassembleianas é João 14.12, pelo fato de mencionar “coisas maiores” do que as realizadas por Jesus. Mas o termo “obras” (gr. ergon) significa: “trabalho”, “ação”, “ato” (VINE. W.E., Dicionário Vine, CPAD, pp.764,827), e não “milagres” ou “manifestações”, estritamente.

Essas obras maiores incluem tanto a conversão de pessoas a Cristo, como a operação de milagres (At 2.41,43; 4.33; 5.12; Mc 16.17,18). Exegeticamente, são obras maiores em número e em alcance. Dizem respeito à quantidade em lugar de qualidade. João 14.12, por conseguinte, não avaliza truques, trapaças, experiências exóticas e antibíblicas, além de fenômenos “extraordinários” (cf. Dt 13.1-4; 2 Ts 2.9; Mt 7.21-23).

O paradigma, o modelo, dos pregadores da Assembleia de Deus deve ser o Senhor Jesus Cristo, que andou na terra fazendo o bem e curando a todos os oprimidos do Diabo porque Deus era com Ele (At 10.38). É perigoso quando resolvemos ter um ministério “sem limites”, em que nada pode ser contestado, à luz da Bíblia. Tudo deve, sim, ser regulado, controlado pelo Espírito Santo e pela vontade de Deus esposada em sua Palavra (Mt 7.15-23; 1 Jo 4.1; 1 Ts 5.21; 1 Co 14.29; Jo 7.24, etc.).

Na Palavra de Deus não há nenhum fundamento para o “cair no poder” e outras aberrações. O Senhor Jesus nunca derrubou ninguém. Ele não arremessa pessoas ao chão mediante sopros “ungidos” e golpes de paletó. Quem gosta de lançar as pessoas ao chão é o Diabo (Mc 9.17-27). Em Lucas 4.35, está escrito: “E Jesus o repreendeu, dizendo: Cala-te e sai dele. E o demônio, lançando-o por terra no meio do povo, saiu dele, sem lhe fazer mal”. Jesus, o maior Pregador que já andou na terra, e seus apóstolos nunca impuseram as mãos sobre pessoas para levá-las ao chão. Eles jamais sopraram sobre elas ou lançaram parte de suas roupas a fim de derrubá-las.

Considero importantes os milagres e as curas, no nosso meio, Mas, na hierarquização feita por Deus, o Ministério da Palavra tem prioridade (1 Co 12.28; Jo 10.41). Os sinais, prodígios e maravilhas devem ocorrer naturalmente, como consequência da pregação do Evangelho (Mc 16.15-20). E Deus precisa estar no controle, sempre. Mas hoje há muita imitação, falsificação, misticismo no meio dito assembleiano, que é na verdade neoassembleiano.

“Converte-nos, SENHOR, a ti, e nós nos converteremos; renova os nossos dias como dantes” (Lm 5.21).

Ciro Sanches Zibordi

Comentários

Rô Moreira disse…
Meu querido Pr. estes foram uns dos motivos que me fizeram sair da AD , infelizmente, onde ela se misturou com os Neopentecostais e aí virou uma bagunça só. Me perdoe em dizer isso, mas tudo agora vira método, regra, é quebra de maldição, campanhas de prosperidade e por aí vai. É lamentável. Paz
Jean Patrik disse…
Pastor Ciro essa vc não pode perde

http://www.youtube.com/watch?v=tTuwpYRYue4&playnext=1&videos=BoNJmmVaI-U&feature=sub
Anônimo disse…
O qUE MAIS me incomoda e que os lideres continuam convidando esses caras para pregar ou melhor derribar os crentes na igreja
Levi Costa disse…
Faço parte do coro dos que lamentam diante da situação em que nos encontramos.
Assembleiano que sou, desde a minha mais tenra idade, pois sou filho e neto de crentes da querida assembléia. Agora vemos uma mistura num só caldeirão, neo alguma coisa. Tenho postado em meu blog (levicosta.blogspot.com), alguns alertas nesse sentido, para cooperar com aqueles que não se conformam com os modismos, inovações e heresias que tem se instalado no seio da igreja evangélica brasileira.
Boa Tarde,

Parabéns pelo dia de hoje todos os 364 dias também!

A Paz de Cristo!

Verdade que hoje as pessoas buscam muitas soluções para suas necessidades, só que há uma diferença e essa diferença esta no interior do ser humano onde somente Deus pode sondar (SL 139), E'le sabe a intenção e conhece bem a reação das pessoas ao conseguirem a realização de seus desejos. Por isso creio plenamente que Deus vai nos preparando gradativante para assimilarmos tudo aquilo que será realizado, mediante é claro a seu notório principio da obediência, o que também não quer dizer que Deus irá realizar curas e outros milagres somente por sermos obedientes, mas principalmente pela soberana vontade e obra. Entendo também que Deus está muito preocupado com o fim de nossas caminhadas, ou seja, que estejamos crescendo em santidade, pois é ela que nos fará alcançar a salvação, o próprio Jesus disse Mt 7:20,21,22,23. Deus me deu uma mensagem muito própria para mim e para essas pessoas que ainda não tem entendimento sobre a verdade, o título é: Quer cura, venha se relacionar com Deus. Fico por aqui deixando a paz de Cristo e um grande abraço para ti.

Deus continue te usando.

Marcio Bello
Caro irmão e amigo pastor Ciro Zibordi,

A Paz do Senhor!


Compartilho do mesmo sentimento e preocupação, por isso me associo às suas palavras também nesse artigo.

Parabéns pelo novo layout do blog e por incluir o Point Rhema em seus links.

Um grande abraço!

Seu conservo,
Pr. Carlos Roberto
juberd2008 disse…
Caro Pr. Ciro,

Excelente artigo, a mim só resta assinar embaixo. Esses "novos moveres", só trazido confusão no seio da nossa querida AD.

Um abraço.
ROBSON SILVA disse…
Paz, meu amigo...

Faz tempo que não comento aqui no BCSZ, não é mesmo... Ainda assim leio, "religiosamente" todos os teus posts...

Vejo que somos contemporâneos: 87. Apesar de eu vir de uma família assembleiana, foi nesse ano que confessei a JESUS como único e suficiente salvador da minha vida... Lá se vão 23 anos... Como passou rápido...

Muita coisa boa passamos naqueles primórdios... Coisas maravilhosas vimos acontecer... E ainda hoje o Senhor tem operado - faço questão de postar no PPA as maravilhas do nosso DEUS.

Por sua vez, chegamos a esse momento trágico da nossa denominação; da Igreja como um todo...

As vezes fico a me perguntar o quanto de culpa não carrego em minhas mãos por este atual estado de coisas... Será que não deveria ter feito mais? Será que ainda há tempo para fazer mais? Às vezes choro só de pensar...

Mas nada nem ninguém vai me separar do AMOR de DEUS que está em CRisto Jesus...

NEO ou VETERO, eu prossigo ASSEMBLEIANO para o Alvo, para o prêmio da soberana vocação em Cristo Jesus...

Abraços,

NELE,

Robson Silva
o miudinho
Pastor e amigo Robson,

A paz do Senhor!

Também tenho visitado o PPA, a despeito de não comentar.

Eu também nasci num lar evangélico, mas o Evangelho só nasceu em mim em 1985, quando entreguei minha vida a Jesus na Assembleia de Deus. Em 1987 fui batizado, depois de dois anos! Isso mesmo. Até eu não entendo porque demorei tanto tempo para descer às àguas do batismo!

Na verdade, eu não havia me entregado completamente ao Senhor e por isso tinha receio de ser batizado. A Assembleia de Deus como um todo, de lá para cá, mudou, e muito. Mas, graças a Deus, ainda há "reservas" de Deus, como eu tenho verificado em minhas viagens.

Façamos a nossa parte em prol do Reino de Deus.

Em Cristo,

CSZ
Nem "neo" nem "vetero"; apenas assembleiano
Caro amigo Juber,

A paz do Senhor!

Agradeço-lhe por firmar junto comigo.

Um grande abraço.

CSZ
Caro amigo Carlos Roberto,

Agradeço-lhe pelas palavras. O seu blog tem status de "conselheiro vitalício" em meu blog (risos).

CSZ
Caro Jean Patrik,

Sinceramente, nos dois vídeos, falou-se, falou-se... Mas nada de argumentação consistente se ouviu. A informação importante é o fato de o "tal" ter pertencido às Assembleias de Deus durante 16 anos. Podemos, pois, considerá-lo um desviado das ADs, que agora prega contra ela.

Um abraço.

CSZ
Irmã Romilda,

Há muitas pessoas que deixaram as Assembleias de Deus por não concordarem com o neoassembleianismo, o qual está de mãos dadas com o neopentecostalismo, que, por sua vez, deriva do neoliberalismo. Como se vê, nesse caso, o prefixo "neo" não indica nada de novo no sentido positivo.

Que Deus abençoe a irmã em sua igreja local!

CSZ
Rô Moreira disse…
Obrigada meu querido, Deus lhe abençoe cada dia mais!
Amigo do Apolo Getúlio disse…
Pastor Ciro, Shalom! Amei este Post. Parabéns pela maneira leal com que trata a Palavra do Senhor.
Conheço um irmão que não só derruba as pessoas com também tem a mania de soprar forte em seus ouvidos. Eu acredito que soprar nos ouvidos é antibíblico e pode estourar os tímpanos. O que o irmão acha? Gostaria que publicasse algo sobre isso: Sopros e Sopro no ouvido. Deus abençoe...
Anônimo disse…
sou membro desde 1982. Confesso para o senhor que cansei de sempre combater as mesmas coisas e não haver mudanças. Lições que são rasgadas em púlpito, escritores que são chamados de endemoninhados entre outras coisas. Sei que devemos continuar pregando, mas já cansei de ser objeto de desafeto e de inquietação. Cansei de ser mal visto e colocado de lado. Não desisti da verdade, só estou cansado. Se a mentalidade da liderança maior, de quem está a frente não mudar ou se não houver sanções para tantas coisas antibilicas o falar sozinho não produzirá o efeito.

Valdeci do Carmo
Paz do Senhor Pastor, sou membro da Assembleia de Deus desde 2007 e, portanto não tenho saudades do passado, pois não nasci num lar Cristão. O que me faz concordar com o egrégio Pastor é o fato de que para tudo é preciso ordem, hierarquia. Deus fez o mundo de forma sistemática, organizada. Qual é então o motivo de querer "inventar moda" em nossos cultos? Deus pode operar como bem entender em meio ao povo, mas como já presenciei "cair no Espírito" com um empurrão? Sem comentários. Deus continue te abençoando.